A Lei e a Profecia
Simone Furquim Guimarães
A leitura do Evangelho hoje, é Mc 9, 2-13, conhecida como transfiguração de Jesus. No alto da montanha estão os três discípulos (Pedro, Tiago e João), Jesus, Moisés e Elias. E de uma nuvem, o Pai exorta aos discípulos: “Este é o meu Filho amado; ouvi-o!” (v.7).
O Evangelho de Marcos, escrito por volta do ano 70 d.C, faz memória dos ensinamentos de Jesus Cristo, e percebe que o evento Jesus é continuação do que aprenderam sobre a Lei (representada na figura de Moisés) e sobre a profecia (representada na figura de Elias). Moisés e Elias desaparecem, mas Jesus permanece; e permanece desde os dias atuais.
Jesus permanece para que possamos unir a Lei e a profecia. Seguir a Lei (a vontade do Pai) e profetizar implica uma profissão de fé e uma postura política de assumir o cuidado com o outro que mais sofre. Os relatos dos Evangelhos testemunham esta postura de Jesus.
E o Evangelho de Marcos nos ensina ainda que a construção da vontade de Deus aqui na terra passa necessariamente pela cruz. É o que narra a leitura anterior (Mc 8,34-38). A consequência de sua fé e de sua postura política diante dos empobrecidos de seu tempo levou-o à cruz. A cruz faz parte do caminho de Jesus e do caminho das comunidades cristãs.
Hoje, diante dos problemas humanos e do cuidado com a natureza, o Pai nos exorta a ouvir seu filho: “Este é o meu filho amado, ouvi-os!”. Então, fazer a vontade de Deus é profetizar, dizendo que a tragédia ocorrida nesta semana na cidade de Petrópolis não é da vontade de Deus, mas sim do descaso do governo que não investe em políticas públicas de moradias para sua população. Bem como dizer que as mais de 600 mil mortes pela COVID 19, não é da vontade de Deus, como muitas pessoas afirmam.
O profeta Elias incomodou os governos de seu tempo, foi ameaçado de morte, correu riscos. Jesus, profeta, incomodou os governos de seu tempo, por isso foi assassinado. Denunciar as violências causadas pelas pessoas, denunciar a corrupção e o descaso dos governantes de hoje é também se tornar uma pessoa incômoda e alvo de ameaças, como acontece, por exemplo, com o padre Júlio Lancelotti, vítima, inclusive, de alguns religiosos dentro da própria igreja. Isso indica que ele está no caminho certo: “tomou a sua cruz”. Não podemos nos calar, a profecia não deve ser silenciada, pois devemos continuar ouvindo a voz do Filho Amado!
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Simone Furquim Guimarães é mestre em Teologia na linha bíblica. Tem experiência na área de Leitura Popular da Bíblia no Centro de Estudos Bíblicos (CEBI/Planalto Central).
Esta reflexão bíblica foi originalmente apresentada no Programa de Justiça e Paz, produzido pela Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Brasília, que vai ao ar todo sábado, às 11:00, na Rádio Nova Aliança.
Desde outubro de 2020, também disponível no podcast Ignatiana.
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IGNATIANA é um blog de produção coletiva, iniciado em 2018. Chama-se IGNATIANA (inaciana) porque buscamos na espiritualidade de Inácio de Loyola uma inspiração e um modo cristão de se fazer presente nesse mundo vasto e complicado.