Palavras de vida eterna
Simone Furquim Guimarães
João 6,60-69
Jesus estava na sinagoga com seus discípulos. Havia feito um discurso sobre o significado da multiplicação dos pães e sobre o sentido do Pão da Vida (Jo 6,1-59). Após esse discurso muitos discípulos “voltaram atrás e não andaram mais com Jesus” (v.66).
Abandonaram o Seguimento de Jesus porque consideravam uma blasfêmia Jesus revelar uma identidade divina: “Eu sou o “pão vivo descido do Céu”. Eles disseram: “Essa palavra é dura! Quem pode escutá-la?” Jesus questiona-os: “Isto vos escandaliza?”. O significado da palavra “escândalo”, do grego, é “obstáculo”. O Seguimento de Jesus era um obstáculo para aqueles judeus, pois tirava-os da comodidade e conforto que aquela instituição religiosa oferecia.
E no contexto das comunidades cristãs, quem seguia Jesus era expulso das sinagogas, pois o Pão Vivo (Jesus), ensinava e vivia o projeto de Deus que não era aceito pelas autoridades da fé.
Os discípulos que abandonaram Jesus eram simpatizantes aos seus ensinamentos, mas não conseguiram avançar no Seguimento, por isso, abandonaram o caminho. Abandonaram o Caminho porque ainda tinham a mentalidade da religião da época, de uma teologia da retribuição, que prega a salvação em troca de onerosos dízimos. Esta é a limitação humana denunciada por Jesus: “viver segundo a carne”. Para eles, era duro ter que assumir a essência do Evangelho, que é de lutar por vida com dignidade para aqueles que estavam excluídos. Era mais fácil ficar circunscritos nas sinagogas e templos para orar e praticar os rituais.
O evangelista ensina que para ser discípulo deve seguir o Espírito. Jesus explica aos Doze que é o Espírito que vivifica. Ou seja, quem ouve e acolhe o Espírito de Deus, seguindo o sentido das coisas de Deus, seguindo o projeto proposto por Deus, que é de cuidar da criação, cuidar das pessoas, para que não haja pobres em nosso meio; esse sim, consegue entender a essência do Evangelho.
Atualmente, vivemos no contexto de morte, miséria e fome, causada não somente pela COVID 19, mas, sobretudo, por falta de um projeto de política pública que cuide verdadeiramente das pessoas. E há quem ainda utiliza do texto bíblico para desrespeitar aqueles que não têm o que comer hoje e muito menos amanhã. Uma realidade terrível em nosso país.
Que tenhamos coragem de seguir Jesus Cristo e tenhamos coragem de denunciar, como Jesus, aqueles que deturpam a Palavra de Deus para se eximir das responsabilidades e tenhamos coragem em denunciar aqueles que não respeitam o sofrimento dos mais vulneráveis de nossa sociedade.
Assim como Pedro, professamos nossa fé: “Senhor, Tu tens palavras de vida eterna e nós cremos e reconhecemos que és o Santo de Deus” (v.68).
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Simone Furquim Guimarães é mestre em Teologia na linha bíblica. Tem experiência na área de Leitura Popular da Bíblia no Centro de Estudos Bíblicos (CEBI/Planalto Central).
Esta reflexão bíblica foi originalmente apresentada no Programa de Justiça e Paz, produzido pela Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Brasília, que vai ao ar todo sábado, às 11:00, na Rádio Nova Aliança.
Desde outubro de 2020, também disponível no podcast Ignatiana.
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IGNATIANA é um blog de produção coletiva, iniciado em 2018. Chama-se IGNATIANA (inaciana) porque buscamos na espiritualidade de Inácio de Loyola uma inspiração e um modo cristão de se fazer presente nesse mundo vasto e complicado.