Vlamir Francisco Alves

O discurso sobre Deus vem depois do silêncio, da oração e do compromisso.

Gustavo Gutiérrez

Comecei a tomar contato com o modo de orar de Inácio de Loyola num breve retiro em Itaici, São Paulo, há mais de 40 anos. Relembrando hoje, entendo que era essa mesma a finalidade daquele “Oração e Libertação”, orientado pelo Pe. Ramon, SJ. Eu, adolescente, vindo de um momento difícil com a perda da minha mãe, tateava nas tentativas de um encontro mais íntimo com o Senhor através da leitura diária e contínua, como se lê um livro, dos 4 evangelhos. A personagem central me cativava: destemido, amoroso com todos, incompreendido. Era meu herói, num tempo difícil, eu que, ao contrário de muitos outros da minha idade à época, nunca havia buscado um herói antes num livro ou em quadrinhos. O que me trouxe então essa primeira experiência com o modo de orar proposto por Inácio: acolhimento. Senti que ali não fiquei à frente de um outro maior, mais forte, dominador, mas sim de alguém que simplesmente me amava, do jeito que eu era, do jeito que eu estava.

Minha segunda experiência marcante nesta jornada de aprendizado foi num outro pequeno retiro. “No Caminho de Emaús” foi conduzido segundo Lc 24, 13-35 pelo Pe. Iglesias, SJ e os noviços jesuítas da antiga Província Centro-Leste. Ainda jovem, em busca de um projeto de vida, pude encontrar nessa experiência um Companheiro para todo o sempre, que quando fala nosso coração arde, nos desinstala, nos traz um sentido para a existência, qualquer seja a vocação escolhida. Este momento também confirma em mim o desejo de caminhar em comunidade, como os primeiros cristãos. Tive a graça de encontrar companheiros com a mesma inspiração, e daí surgir um grupo de jovens “inaciano” sério, como nos autodenominávamos, assessorado por um homem santo, Pe. Herreros, SJ. Desse grupo, que veio a se tornar uma CVX (Comunidade de Vida Cristã), tenho a maioria dos amigos de caminhada cristã e de vida até os dias atuais.

Daí em diante começaram minhas experiências com os retiros personalizados sem colocações. Inicialmente foram os de 4 dias, nos feriados prolongados de Carnaval ou Páscoa, promovidos pelo Pe. Paulo Pedreira, SJ, e depois os de 8 dias, nas férias escolares e do trabalho. Esses, seguindo mais explicitamente a metodologia dos Exercícios Espirituais inacianos, me mostraram a importância do silêncio interior para melhor escutar o que Deus tem a nos dizer e me impulsionaram à oração pessoal diária como meio de ajuda para discernir o que Ele me pede no dia a dia.

Pertencer a uma CVX, em grande parte de toda essa caminhada, também compôs este percurso de aprendizagem no modo de orar inaciano. Os companheiros de comunidade, os assessores que passaram pelo grupo, como o Pe. Paulo Lisboa, SJ, me ensinaram a confrontar periodicamente meu viver com o Senhor como leigo, no trabalho, na escola, na família, com outras pessoas de diferentes modos de viver. Tudo isso me levou novamente junto aos caminhantes de Emaús, com todos desejosos por entender o mistério da vida do Senhor e recompensados com o ardor no coração quando este Senhor vem e lhes fala diretamente: impulso para sair e anunciar que Deus vive hoje no coração de cada um para nos mostrar, qual seja sua vocação, condição social, estado de vida, que todos nós somos convidados a construir o Seu Reino.

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Vlamir Francisco Alves é leigo, pertencente à Comunidade de Vida Cristã (CVX), comunidade Xavier, São Paulo (SP).

CVX: Uma Vocação

Imagem em destaque: Leonilson (1957-1993). Os Rios por meu fluido entrego meu coração, 1991. Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira.

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