Caminhando e conhecendo a Deus com os Exercícios Espirituais de Santo Inácio: uma experiência

Maria do Socorro Laurentino de Carvalho

Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta entrarei em sua casa e cearemos juntos.

Ap 3,20

Esta imagem do Apocalipse vem falando comigo à medida que caminho com os Exercícios Espirituais (EE) de Santo Inácio. Hoje, com 20 anos de caminhada inaciana, vejo que esta imagem habitava o meu inconsciente, mas eu não a alcançava. Com o decorrer da minha experiência com os EE, foi suscitando em mim uma releitura da Sagrada Escritura, ensinando-me a entender as situações do dia a dia aos olhos da fé.

Era a graça de Deus que iluminava a minha mente, conduzindo-me a uma transformação espiritual, permitindo-me ver que todos os bens descem do alto (EE 237) para buscar e encontrar a Deus em todas as coisas e todas as coisas em Deus.

Os EE foram a porta que se abriu para que eu conhecesse Jesus. Jesus abriu a porta e entrou, fazendo-me conhecê-lo internamente para mais amá-lo e segui-lo. E assim, começou a minha jornada com Jesus.

Os EE representam para mim o “tesouro escondido” (Mt 14,44) que veio a mim fazendo-me sentir amada, alegre e feliz. E é neste caminho da oração inaciana (oração diária, retiros, cursos na área da espiritualidade e acompanhando pessoas em grupos e/ou individualmente), que percebo Deus orientando o meu caminho de vida.

Abrir a porta é deixar Jesus entrar e tomar conta da casa, da minha vida. É acolher a fé a partir de Deus[i].      

Deus é o que move. É o que envia e chama aqueles que Ele quer para estar com consigo.  É o Semeador que sai para semear (Mc 4,2).

Percorrendo este itinerário, foi suscitando em mim o desejo fazer algo mais na Igreja além do acompanhamento dos EE. Neste cenário, surge a figura de Pe. Bernardo Lestiene, SJ, assessor da Comunidade de Vida Cristã (CVX) Dom Luciano, Pequena Comunidade que participo. Pe. Bernardo me acompanhou nos Exercícios Espirituais na Vida Cotidiana (EVC) e – sob sua orientação – passei por um processo de discernimento e acolhi o chamado do “Senhor da Vida”, batendo à porta da Pastoral do Migrante.  

E assim, comecei a missão junto aos migrantes. Convidei Marlene Helena, companheira da CVX, para ingressar neste trabalho pastoral. Como duas discípulas enviadas por Jesus (Lc 10,1), acolhemos ao seu chamado, abrimos a porta e entramos na Pastoral do Migrante. Com a continuidade, o número de operários aumentou com a participação e o apoio da CVX presente em Brasília (CVX-DF).

Na Semana do Migrante em 2020, em pleno isolamento imposto pela pandemia de covid-19, a CVX-DF motivou seus participantes para o desafio pastoral que é a Pastoral dos Migrantes. Realizamos um encontro de reflexão, partilha e oração.

Em 2021, estabeleceu-se a cooperação da CVX Nacional com o Serviço Jesuíta para Migrantes e Refugiados (SJMR), ampliando a participação da CVX na Pastoral do Migrante, no âmbito do microcrédito solidário.

Na certeza de que Jesus vive entre nós (Estive morto e eis que vivo pelos séculos: Ap 1,18) e porque nos ama, torna-se interior a nós, ensinando-nos pelo seu Espírito a sermos filhos de seu Pai. Age em nós, soprando o seu Espírito para sermos no mundo germe de unidade, esperança e salvação, instrumentos de redenção universal. Resta-nos dizer: Vinde Senhor! Maranatha[ii].  E o Senhor nunca deixará de bater à nossa porta.

E para terminar, vejo que há dois movimentos ao abrir a porta: o primeiro, de saída, sair do meu próprio amor, querer e interesse; e o segundo, de entrada, para caminhar e semear sempre o novo (Evangelli gaudium). Convicta de que Deus é quem toma a inciativa e vem ao nosso encontro, eu vivencio hoje esta caminhada de entrada e saída para um encontro pessoal com o seu Filho Jesus (Evangelli gaudium), em uma Igreja em saída, com as portas abertas, misericordiosa, pobre, com os pobres e para os pobres[iii].

Agradecimentos:

Aos companheiros da CVX Brasil, Gina Torres (RJ), pelo convite para escrever o texto; Marlene Helena e Osmar Arouck, (DF), pela revisão e sugestões.


[i] LEFRANK, Alex. Primeira Semana na perspectiva do exercitante: para encontrar minha verdadeira identidade. Itaici: Revista de Espiritualidade Inaciana, v. 18, n. 72, p. 66-72, jun. 2008.

[ii] Dom Luciano Mendes de Almeida. Servir por Amor: Trinta dias de Exercícios Espirituais. Edições Loyola. São Paulo, Brasil, 2001.

[iii] Conselho Nacional do Laicato (CNLB). Agenda formativa, 2018.


Maria do Socorro Laurentino de Carvalho é leiga, pertencente à Comunidade de Vida Cristã (CVX), comunidade Dom Luciano, Brasília (DF).

CVX: Uma Vocação

Imagem: Márcia Barroso do Amaral (1943-). Sem Título, 1982. Enciclopedia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira.

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IGNATIANA é um blog de produção coletiva, iniciado em 2018. Chama-se IGNATIANA (inaciana) porque buscamos na espiritualidade de Inácio de Loyola uma inspiração e um modo cristão de se fazer presente nesse mundo vasto e complicado.

2 comentários Deixe um comentário

  1. Obrigada por compartilhar sua experiência! Saudades do padre Bernardo!
    Essa imagem dos dois movimentos ao abrir a porta – de saída e de entrada – é por demais tocante e verdadeira! Gratidão!!

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