Não nos acostumemos com a destruição

Luiz Fernando Krieger Merico

Mística do século XXI — programa nº44

Reflexões a partir das encíclicas
Laudato si’ e Fratelli tutti

Ao acompanhar nossa realidade e acompanhar o que acontece nas várias regiões do mundo, vemos como tem se tornado impressionantes as catástrofes ambientais. Assistimos a incêndios em países inteiros – Canadá, Grécia, Estados Unidos, África, China. Assistimos a inundações de proporções gigantescas na Ásia e em várias partes do mundo. Secas espalhadas em todos os continentes. E recordes e mais recordes de altas temperaturas em todos os países, nem importando mais em que estação do ano estamos. Nos acostumamos também a ver o desfazimento dos recifes e corais, o degelo das geleiras e a acidificação dos oceanos, bem como a elevação do nível de águas dos oceanos afetando as áreas costeiras. Proporções massivas de sargaço têm chegado ao Caribe, inviabilizando muitos potenciais turísticos. Partes vitais de ecossistemas de suportes de vida planetários, tal como a Amazônia, sendo destruídos das mais variadas formas. Terras produtivas tornando-se desertificadas.

Esses e muitos outros impactos têm tomado conta dos noticiários e de nosso dia-a-dia. Como há muitos e muitos impactos ambientais, corre-se o risco de que isto passe a ser percebido como coisa normal, aceitada pela sociedade humana como algo corriqueiro. É verdade que muitos tem chamado esta situação de o nosso novo normal. Mas não podemos deixar de perceber que esta situação é extrema e não tem nada de normal. Não podemos “normalizar” a destruição das condições de vida.

Chama também a atenção que as pessoas não se perguntam a origem dos problemas e não se mobilizam em nenhuma frente ou dimensão social para alterar rumos do que está acontecendo. É difícil entender o significado disto.

No seu parágrafo 59, a encíclica Laudato Si’ nos coloca que “como frequentemente acontece em épocas de crises profundas, que exigem decisões corajosas, somos tentados a pensar que aquilo que está a acontecer não é verdade. Se nos detivermos na superfície, para além de alguns sinais visíveis de poluição e degradação, parece que as coisas não estejam assim tão graves e que o planeta poderia subsistir ainda por muito tempo nas condições atuais. Este comportamento evasivo serve-nos para mantermos os nossos estilos de vida, de produção e consumo. É a forma como o ser humano se organiza para alimentar todos os vícios autodestrutivos: tenta não os ver, luta para não os reconhecer, adia as decisões importantes, age como se nada tivesse acontecido”.

Contra este estado de coisas, já no parágrafo 61, a Laudato Si’ ressalta que a “…esperança convida-nos a reconhecer que sempre há uma saída, sempre podemos mudar de rumo, sempre podemos fazer alguma coisa para resolver os problemas. Todavia parece notar-se sintomas de um ponto de ruptura, por causa da alta velocidade das mudanças e da degradação, que se manifestam tanto em catástrofes naturais regionais como em crises sociais ou mesmo financeiras, uma vez que os problemas do mundo não se podem analisar nem explicar de forma isolada. Há regiões que já se encontram particularmente em risco e, prescindindo de qualquer previsão catastrófica, o certo é que o atual sistema mundial é insustentável a partir de vários pontos de vista, porque deixamos de pensar nas finalidades da ação humana”. Finaliza a encíclica: «Se o olhar percorre as regiões do nosso planeta, apercebemo-nos depressa de que a humanidade frustrou a expectativa divina»


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Encíclicas ecofraternais do Papa Francisco

Laudato si’, sobre o cuidado da casa comum (2015)
Fratelli tutti, sobre a fraternidade e a amizade social (2020)

Luiz Fernando Krieger Merico é graduado em Geologia (UFPR), mestre em Análise Ambiental (UNESP), doutor em Geografia (USP), possui aperfeiçoamento no Schumacher College (Inglaterra) em Economia Ecológica. É autor do livro Mística do século XXI: Guia de Oração com as encíclicas Laudato Si’ e Fratelli Tutti (e-book).

Ecologia Economia Mística do século XXI

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IGNATIANA é um blog de produção coletiva, iniciado em 2018. Chama-se IGNATIANA (inaciana) porque buscamos na espiritualidade de Inácio de Loyola uma inspiração e um modo cristão de se fazer presente nesse mundo vasto e complicado.

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