Quero ver o direito brotar

Simone Furquim Guimarães

A imprensa internacional, a ONU, os países de forte tradição democrática como os EUA, França e dezenas de outras nações condenaram e qualificaram os eventos ocorridos em Brasília, dia 8 de janeiro, como tentativa de golpe de Estado e, muitos deles, nomearam os seus participantes de terroristas e vândalos pelos rastros indescritíveis de destruição de prédios considerados obras primas da arquitetura mundial, por causa das obras de artes danificadas, que eram únicas e preciosas à identidade e à cultura nacional.

Essas desprezíveis ações tinham a expressa intenção de depor pela força o atual governo, destruir as instituições da República e violar a Constituição Federal. Diante desta situação, o que a Palavra de Deus, na Bíblia, nos ilumina para que consigamos buscar a justiça como meio para atingir a paz? Este é o tema da reflexão da Comissão Justiça de Paz hoje.

Quando voltamos o olhar para toda histórica do povo da Bíblia, percebemos que toda vez que o povo começa a desviar-se do caminho, a quebrar a Aliança com Deus, surge um profeta para fazer memória que Deus é aquele que livrou o povo da casa da escravidão do Egito, que caminhou com este povo para alcançar à terra prometida e vivesse com justiça e paz, assim como exortava o profeta Amós: “Quero ver o direito brotar e correr a justiça qual riacho que não seca” (Amós 5,24).

No Segundo Testamento, os primeiros cristãos que escreveram os Evangelhos, perceberam que agora é Jesus de Nazaré que os ensina a buscar a justiça e paz, conhecido como Reino de Deus. A “terra prometida” não é mais uma conquista territorial, mas sim um projeto de sociedade que busca a justiça como meio para atingir a paz: “Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas serão acrescentadas a vocês” (cf. Mt 6,33)

Assim também, nós hoje, todas as vezes que nos desviamos do projeto de Deus, precisamos voltar nossos olhos, ouvidos e conhecimentos para o nosso passado. A história nos ensinou que desde o fim da ditadura (1964 a 1985) vamos conquistando cada vez mais um projeto democrático e de justiça em nosso país, mesmo que num ritmo mais lento do que gostaríamos. Não devemos jamais desviar deste projeto. Portanto, quando pessoas atentam contra a democracia, cometem crimes contra a Constituição Cidadã de 1988; devem ser punidas no rigor da lei, sendo-lhes garantidos todos os direitos que a própria lei determina para que não haja abuso de poder e nem violências. E estas garantias às pessoas que estão presas em decorrência dos gravíssimos eventos estão sendo asseguradas, conforme atestam as entidades de direitos humanos, a exemplo da OAB e órgãos de estado, como o Ministério Público Federal. 

Aplicar a lei penal para esses casos é uma imposição e caminho pedagógico para que nós não desviemos da nossa conquista maior em nossa sociedade, que é viver a liberdade de um Estado democrático para que todas as pessoas possam participar com equidade de direitos e para que todos tenham vida em abundância.

O nosso querido papa Francisco mais uma vez atento as urgências do mundo, fez uma clara referência á situação brasileira. Segundo ele, em muitas áreas, um sinal do enfraquecimento da democracia é a polarização política e social aumentada, que não ajuda a resolver os problemas urgentes dos cidadãos, nas numerosas crises políticas em diversos países do continente americano, com sua carga de tensões e formas de violência que aprofundam os conflitos sociais.

Em tempos de ausência de justiça e paz, nosso horizonte deve nos levar ao sonho do profeta Isaías: “E essa justiça trará paz; haverá sossego e confiança para sempre. Meu povo viverá em paz, tranquilo em seu lar; terá descanso e segurança”. (cf. Is 32,17-18).

14/01/2023

 


Ouça no Podcast Ignatiana [link]


Simone Furquim Guimarães é mestre em Teologia na linha bíblica. Tem experiência na área de Leitura Popular da Bíblia no Centro de Estudos Bíblicos (CEBI/Planalto Central).


Esta reflexão bíblica foi originalmente apresentada no Programa de Justiça e Paz, produzido pela Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Brasília, que vai ao ar todo sábado, às 11:00, na Rádio Nova Aliança.

Desde outubro de 2020, também disponível no podcast Ignatiana.

Palavra de Deus Simone Furquim Guimarães

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IGNATIANA é um blog de produção coletiva, iniciado em 2018. Chama-se IGNATIANA (inaciana) porque buscamos na espiritualidade de Inácio de Loyola uma inspiração e um modo cristão de se fazer presente nesse mundo vasto e complicado.

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