Quem é este menino?
Simone Furquim Guimarães
Neste dia de Natal, ganhamos como presente um lindo poema de revelação profunda sobre a origem do Menino que nasceu. É o evangelista João que nos oferece essa reflexão, logo no início de seu livro, em Jo 1,1-18.
Quem é este menino? Para João, Jesus é a Palavra (Dabar, da língua hebraica que remete a ação). O texto vai dizer: No princípio era a Palavra e a Palavra estava com Deus e a Palavra era Deus. E tudo foi criado por meio da Palavra. Para João, Jesus participa da criação.
Enquanto os outros evangelistas identificavam Jesus como Filho do Homem, Mestre, Messias, Rabi; João vai perceber que Jesus é o próprio Deus que encarnou e habitou entre nós. Lucas e Mateus narram o nascimento de Jesus na perspectiva da história humana: nasceu em Belém e cresceu em Nazaré. Para João, isso não importa, sua perspectiva é mostrar que Jesus vem de Deus e volta para Deus (cf. Jo 7,25-29; 13,1). Jesus então é a Palavra, é Vida, é Luz. Com a origem de Jesus, o que era trevas tornou-se Luz.
João Batista vai ser testemunha dessa luz para que as pessoas possam crer nele. Porém, o mundo não o reconheceu (v.10). Veio para o que era seu (povo de Israel) e os seus não o receberam (v.11). Mas a todos que o receberam deu o poder de se tronarem filhos de Deus (v.12). O evangelista afirma que se tornam filhos de Deus não por mérito próprio, nem por ser da raça de Israel, mas por crer que Deus nos acolhe.
Deus nos acolhe como uma tenda. É assim que o evangelista explica: “E a Palavra se fez carne e armou sua tenda entre nós” (v.14). Esta é a tradução original. Remete ao livro do Êxodo, quando Deus habitava nas Tendas, peregrinando junto com o povo no deserto. Isto quer dizer que Deus não quer ficar longe de nós, nem acima de tudo; pelo contrário, Deus fica no meio de nós, caminha conosco e nos fortalece.
E Jesus veio para revelar esse Deus. Em Jesus, vimos a glória (presença) de Deus. Ele é cheio de graça e de verdade (v.14). O termo graça (hesed, do hebraico) significa misericórdia, solidariedade. São os sinais da Nova Aliança que Deus faz com o povo. O evangelista recorda da Aliança antiga feita por meio de Moisés: “a Lei foi dada por meio de Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo” (v.17). Jesus é a Nova Aliança. Evoca Isaías 55,10-11: “A Palavra é como a chuva que vem do céu e para lá não volta sem ter realizado a sua missão aqui na terra”. Neste prólogo, João resume tudo que vai ser dito e revelado no restante do livro.
Hoje é o dia em que recebemos o maior presente: Deus invisível tornou-se visível num corpo humano, num bebê frágil, nascido na maior condição de pobreza, nasceu em uma estábulo, segundo o evangelista Lucas. Não teve abrigo, como tantos humanos que vivem na miséria; como tantos sem teto. Mas foi por meio dele que conhecemos o Pai (v.18). Deus fez a opção de nascer na pobreza e, na sua vida pública, fez opção pelos pobres e necessitados, para que possamos encontrar, sobretudo naqueles que sofrem, a imagem de Deus, amando-os, compadecendo-nos e sendo solidários com eles.
Feliz Natal!
Lembremos: o que era trevas tornou-se Luz!
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Simone Furquim Guimarães é mestre em Teologia na linha bíblica. Tem experiência na área de Leitura Popular da Bíblia no Centro de Estudos Bíblicos (CEBI/Planalto Central).
Esta reflexão bíblica foi originalmente apresentada no Programa de Justiça e Paz, produzido pela Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Brasília, que vai ao ar todo sábado, às 11:00, na Rádio Nova Aliança.
Desde outubro de 2020, também disponível no podcast Ignatiana.
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IGNATIANA é um blog de produção coletiva, iniciado em 2018. Chama-se IGNATIANA (inaciana) porque buscamos na espiritualidade de Inácio de Loyola uma inspiração e um modo cristão de se fazer presente nesse mundo vasto e complicado.