Luiz Fernando Krieger Merico

A encíclica Laudato Si, do papa Francisco, em seu capítulo 3 discute a nossa noção atual de progresso. Discute o que nós consideramos progresso e prosperidade. No mundo atual temos a situação de quanto mais progresso, mais destruição e menos qualidade de vida.  Se queremos acelerar a transição para um mundo sustentável, isto vai depender de uma nova atitude humana centrada no respeito aos bens comuns da nossa e das futuras gerações. É muito desejável, também, resgatar a sacralidade dos bens e serviços da natureza porque isso ajuda muito redefinir a nossa visão que temos sobre o que é prosperidade.

A nossa noção de prosperidade hoje é puramente material e está fundamentada na busca incessante por um crescimento econômico que é baseado na extração contínua de recursos naturais; só que a nossa biosfera é finita. Isso não pode dar certo. Este é um conflito que deve ser resolvido para nos livrar das armadilhas que nos coloca nosso modelo de desenvolvimento atual. Que tipo, portanto, de prosperidade é compatível com o desafio de construir uma sociedade sustentável?

Nosso conceito de prosperidade deveria consistir na habilidade de florescer como seres humanos, dentro dos limites de nossos ecossistemas que sustentam a vida. Nesse sentido, progresso e prosperidade tem relação com nossa qualidade de vida, nossa saúde, com a felicidade das pessoas e suas famílias. Prosperidade é bem viver, são melhores relações humanas, é confiança na comunidade, nos propósitos compartilhados. Em outras palavras, o conceito de prosperidade deveria nos levar a um nível elevado de bem-estar e ao mesmo tempo reduzir o impacto material no ambiente.

Não significa que devamos abandonar totalmente a dimensão material da prosperidade. Em um mundo profundamente desigual, com grande parcela da humanidade sem acesso aos bens materiais básicos, a justiça social tem que ser também um dos objetivos da prosperidade. Mas a redefinição de o que prosperidade deve incluir a capacidade regenerativa dos ecossistemas, o papel da diversidade de espécies, a integridade da atmosfera, dos solos, dos oceanos. Estes recursos são fundamentais para a qualidade de vida e não são infinitos. Se isto não for feito, a atividade econômica continuará a destruir a integridade ecológica dos ecossistemas, e em muitos casos de maneira irreversível. Isto corresponde a condenar a humanidade a um planeta literalmente empobrecido. O progresso atual acaba gerando, na verdade, mais pobreza.  

Uma resposta possível que se tem apontado como alternativa é a desmaterialização da economia. Alterar o processo produtivo, redesenhar a produção para que seja mais circular, trocar tecnologias e fontes de energia, trocar hábitos de consumo e de comida. Mudar inclusive nossa dieta. Tudo no sentido de desmaterializar progressivamente a economia. Trabalhar com a natureza, e não contra a natureza. Um novo conceito de prosperidade pode emergir daí. Trata-se de uma valorização de componentes não materiais, visando ao florescimento integral dos seres humanos e a uma relação harmoniosa e saudável com o meio ambiente. Não obstante a valorosa contribuição de bons cidadãos e cidadãs ao longo da história, a verdade é que ainda não temos tentado materializar estes propósitos de maneira coletiva, abrangente e consistente.

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Luiz Fernando Krieger Merico é graduado em Geologia (UFPR), mestre em Análise Ambiental (UNESP), doutor em Geografia (USP), possui aperfeiçoamento no Schumacher College (Inglaterra) em Economia Ecológica. É autor do livro Mística do século XXI: Guia de Oração com as encíclicas Laudato Si’ e Fratelli Tutti (e-book).

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