Papa Francisco e os líderes do Sudão do Sul
Alex Pin *
« Estou pedindo a vocês como irmão que fiquem em paz.
Estou pedindo a vocês com o coração »,
disse Francisco.
Conta-se que em mapas antigos quando não se tinha ainda ideia da geografia atual lá pelos lados da Argentina de hoje estava escrito em latim fines terrae, “os confins do mundo”. O Papa Francisco aludiu a essa imagem para dizer que os cardeais foram buscar o Papa precisamente lá. Ei-lo então na Sede romana.
Metáfora sugestiva por diversos lados. Primeiramente nos surpreendeu que o até hoje pensado como centro cultural do mundo, a Europa, esquece todos os países e vai lá no extremo Sul do continente Sul para escolher o bispo de Roma. Que Imperador romano imaginaria um dia que Roma escolhesse algum bárbaro de região longínqua para ocupar-lhe o posto? Agora não se trata do Imperador romano, mas do Pontífice romano que presidirá na caridade a Igreja católica, universal de nome e de realidade. E alguém dos subúrbios geográficos do mundo está lá. Admirável!
Além disso, o Papa nomeou-se a si Francisco com enorme humildade e quase assombro, ao olhar para a corte de traços renascentistas que o cercava no rito da eleição. No meio daquele vermelho púrpura aparece alguém que até então frequentava com simplicidade as periferias de Buenos Aires. A mídia tem chamado a atenção para marca tão evangélica do Papa.
Não tinha incorporado na conduta diária comportamentos comuns em purpurados. Andava de metrô, visita as periferias, convivia com pessoas pobres e simples. Vestia-se e alimentava-se de maneira bem próxima delas. Agora ocupa o lugar mais elevado na hierarquia católica. Que esperar de tal mudança?

Pois foi esse pastor do fim do mundo que fez algo inédito para o métier papal, ajoelhou-se e beijou os sapatos de líderes em conflito do Sudão do Sul — e que ironia, o do sul. Em momento algum da história católica — iniciada, talvez, com o papa Leão, Magno — se imaginou um papa beijando os pés de pessoas negras, africanas.
Ah! Francisco.
O ato, provavelmente, será descaracterizado pela grande mídia. Não alcançará mais que a exterioridade do ato, sobretudo, tendo ocorrido logo após o episódio em que o papa recusa ter a mão beijada por devotos. Mas, o sentido mais profundo da atitude de Francisco reporta à celebração da vigília do sábado santo que se aproxima. É a kenosis. Aquela mesma de Jesus.
* Alex Pin é professor de filosofia.
Veja também
- Retiro espiritual para os Líderes do Sudão do Sul — Casa Santa Marta, Vaticano, 11 de abril de 2019.
- Retiro espiritual para os Líderes do Sudão do Sul — Discurso do Papa Francisco [em espanhol]
- Sudão do Sul — Notícias em El País
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