Investida contra a democracia e à soberania nacional

O tema mais relevante em termos de política interna e externa posto à conjuntura neste mês de abril é a investida do empresário norte-americano (de origem sul-africana) Elon Musk nominalmente contra o Ministro do STF Alexandre de Moraes, com todas as características de orquestração de campanha da extrema direita internacional contra a regulação soberana das chamadas “Big Techs”, especialmente da sua – ex- Twiter e atualmente X, especialmente no que toca à disseminação de desinformação.

A novidade da investida está posta na aparente articulação internacional da ultradireita com pretensão explícita de proteger a sucursal brasileira envolvida em séries criminais – da sistemática produção de notícias falsas à o conspiração por golpe de Estado-, tudo junto ou separado; mas com concentração judiciária no STF e particularmente no gabinete do Ministro Alexandre de Moraes.

Por outro lado, a trama maior envolvida na investida de Elon Musk é a pretensão de desmoralizar e quebrar poderes regulatórios do Estado brasileiro sobre a ação das Plataformas Digitais no território brasileiro, que à sua imagem invocariam poderes absolutos da comunicação privada no espaço público, acima de quaisquer julgamentos éticos e judiciários.

Mas há um fator específico nessa pretensão do proprietário da “X” – a ideologização explícita à extrema direita-, de práticas das Plataformas Digitais em geral, que têm sido respondidas nos países centrais do chamado 1º mundo por expedientes de regulação nacional, cada dia mais exigentes, a exemplo do que realiza a União Europeia.

As respostas brasileiras à investida do presente precisam considerar dois aspectos bem distintos da questão: 1) – a investida criminal do empresário Elon Musk; 2- a necessidade anterior e continuada de regulação das plataformas digitais, ora semiparalizada no Congresso por pressões políticas difusas, a última das quais do próprio Presidente Lira da Câmara Federal.

O primeiro problema vem merecendo resposta específica do Ministro Alexandre Moraes no âmbito do inquérito sobre ‘fake-news’; mas diante do poder de fogo ostensivo do protagonista e da natural lentidão dos processos judiciais, parece ser uma reação insuficiente à capacidade do interlocutor em promover difusão ampliada de notícias falsas.

Por outro lado, a segunda questão clama pela retomada de vários Projetos de Lei paralisadas, a exemplo do PL 2630/2020, que trata especificamente da difusão de “fake-news” pelas Plataformas Digitais; e do PL 2768/2022, que aborda várias questões conexas relativamente às Plataformas: concorrência econômica, privacidade, liberdade de expressão, desinformação, mercado de trabalho, evasão fiscal etc.

O debate prioritário desses dois projetos faz todo o sentido, mas é precisos prestar atenção para a complexidade das questões envolvidas, que certamente não demandam os mesmos ritmos e foros políticos; comparativamente às respostas políticas ao empresário proprietário da “X”, cujas investidas provavelmente se acumpliciariam aos responsáveis pela tentativa de golpe de Estado no final do governo Bolsonaro.

Os desdobramentos institucionais desse fator Elon Musk irão ficar mais evidentes a partir dos níveis de produção de desinformação maciça que a Plataforma “X” vier a vincular doravante, que é diferente da desinformação costumeiramente produzida por grupos de usuários e operadores, com simples anuência ou omissão das Plataformas em relação às “fake-news”. È para isto que precisaríamos nos preparar, e principalmente os Poderes de Estado reagir, de maneira convergente, provavelmente contra-atacando o protagonista criminal no seu ponto mais sensível – a liberdade de movimentação financeira. E para os casos evidenciados de conexão com os envolvidos no inquérito do golpe de Estado, já há material suficiente, pelo que nos falam os juristas, para o Ministério Público preparar denúncias e o STF promover julgamentos próximos dos principais envolvidos; cortando com sentenças lapidares os eventuais arranjos conspiratórios internos.

A democracia tem os seus antídotos contra conspirações internas ou externas, de modo que precisa exercitá-los em situações críticas, sem excessos, como também sem demasiado apego aos rituais puramente burocráticos que não respondem adequadamente aos desafios envolvidos.


Guilherme Delgado é doutor em economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Imagem: Humberto Espíndola (1943-). Boi-bandeira, 1968. Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira.

Economia Política

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