A trama golpista e o inquérito da Polícia Federal
Guilherme C. Delgado
O que muda com a conclusão do inquérito da
Polícia Federal sobre golpe de Estado
Na última semana de novembro de 2024 a Polícia Federal concluiu uma longa investigação, cujos motivadores diretos foram às invasões de 08/01/2023 às sedes dos Poderes de Estado em Brasília; mas que como já se desconfiava desde o início, continha articulações golpistas muito mais profundas na cúpula do Poder Executivo e ramificações idem na área militar.
Como já é do conhecimento geral, prescindindo de detalhes, foram indiciados 37 nomes de altas autoridades de então, encabeçadas pelo ex Presidente Bolsonaro e alta cúpula militar, acusados de formação de quadrilha para atentar contra a posse do Presidente eleito Lula, mediante golpe de Estado, com requintes adicionais do planejamento à eliminação física dos eleitos (Lula e Alkimin) e do próprio Presidente do TSE de então (Alexandre de Morais).
A partir de agora, a conclusão do inquérito da PF e suas revelações indiciárias fartamente corroboradas passam a funcionar como fato político e judiciário referencial mais relevante dos primeiros meses de 2025. E a demora em concluir tal inquérito pressiona o Ministério Público e o STF a se manifestarem mais rapidamente sobre o conteúdo das investigações; gerando na sociedade sentimento de cobrança à conclusão do processo judiciário. Essa cobrança tem também muita relação com o processo político-eleitoral regular de 2026 – sucessão presidencial e de governadores e eleições parlamentares em todos os níveis –, que precisa ficar descontaminado da trama golpista; principalmente pelo efeito impunidade que espalha resíduos negativos às instituições democráticas.
Por sua vez, a divulgação do Relatório do inquérito da PF (cerca de 600 páginas) e sua circulação ampla pela internet, preservado o sigilo de pequenas partes, contem recado implícito muito evidente: não há tempo para dilações, litigância de má fé ou soluções postergatórias. Haverá que se concluir este processo ainda no primeiro semestre de 2025, sob pena de colocar a própria democracia de férias, que é o desejo oculto dos acusados.
Com a palavra neste início de ano novo ao Procurador Geral da República, que como chefe do Ministério Público Federal deve se pronunciar sobre o Relatório do inquérito recebido, a partir do que se desencadeia no STF o julgamento de instância única relativamente às autoridades com prerrogativa de foro especial.
Quero crer que as instituições funcionarão no tempo devido; mas não nos iludamos, porque haverá manobras postergatórias ao julgamento. Outras iniciativas menos convencionais, a exemplo das intervenções externas, tão ao gosto da família Bolsonaro, parecem agora mais improváveis. Anistia interna providenciada pelo Congresso também parece improvável. E as estratégias de defesa dos réus da alta cúpula dificilmente irão combinar, a começar pela defesa do ex-presidente Bolsonaro, que pelo que se divulga agora (Revista Carta Capital – 11/12/2024), estaria inclinado a jogar toda culpa no seu primeiro escalão de governo.
Finalmente, do julgamento dos réus apontados no inquérito sobrarão evidências para reforma de instituições notoriamente envolvidas na Quadrilha do Golpe, com exuberante participação de militares da ativa. Mas deixemos “cada agonia para seu próprio dia”, até para irmos aprendendo na caminhada, sem antecipar episódios a priori. Mas como escapamos do pior, não se pode praticar o exercício ao mesmo tempo usual e logicamente absurdo de “tolerar a intolerância”.
Guilherme Delgado é doutor em economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Imagem: Alfredo Volpi. Reunião à Mesa, 1943.Enciclopédia Itaú Cultural.
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