Rezar com o Presépio (VI)

Osmar Ferreira

O boi, o burro e toda a bicharada

Hoje rezaremos com a bicharada. Aqui nossa imaginação poderá deixar-se guiar pelas lembranças de animais que povoam nosso bestiário interior.

Pelo relato de Lucas (2,7-8), sabemos que há animais porque ele menciona a manjedoura, onde os animais costumam comer no estábulo. O texto também fala de rebanhos guardados por pastores. Nos presépios, costumamos incluir outros animais que fazem parte de diferentes ambientes.

Recorda o Papa Francisco em sua exortação apostólica[1]:

O Salvador nasceu num presépio, entre animais, como sucedia com os filhos dos mais pobres.

Evangelii gaudium, 197

Hoje, nossa leitura sagrada será tirada do Livro de Daniel, um trecho do Cântico dos três jovens:

Baleias e peixes, bendigam o Senhor;
louvem e exaltem o Senhor para sempre.

Aves do céu, bendigam o Senhor;
louvem e exaltem o Senhor para sempre.

Animais selvagens e domésticos,
bendigam o Senhor;
louvem e exaltem o Senhor para sempre.

Dn 3,79-81

Neste trecho do cântico, os animais são reunidos em três grupos: os que vivem na água, as aves e os animais selvagens e domésticos. Todos são convidados a louvar a grandiosidade do Criador.

O Presépio é uma representação alegórica que abraça tudo o que destaca a beleza e o amor do nosso Deus. As crianças, ou a criança que existe em nós, nos ajudam a incluir no presépio a diversidade da fauna dos quatro cantos do mundo.

Talvez possamos ancorar a Arca de Noé (Gn 7,8-9) pertinho do presépio e incluir todos os animais na cena.

Nos presépios, sempre vemos dois animais muito familiares: o boi e o burro. Desde muito tempo, a arte cristã costumou colocar um boi e um burro perto do Menino Jesus na manjedoura. De acordo com especialistas, isso se relaciona com o começo do Livro de Isaías:

Escutem, céus; ouça, ó terra! Javé é quem fala: Eu criei e eduquei filhos, mas eles se revoltaram contra mim. O boi conhece o seu proprietário, e o burro a cocheira do seu dono, mas Israel não conhece nada, o meu povo não entende.

Is 1,2-3

Várias pinturas da Idade Média e do Renascimento retrataram o boi e o burro na cena do nascimento de Jesus. Guimarães Rosa presenteou-nos com uma obra poética intitulada “O burro e o boi no presépio”, inspirada em uma série de quadros que representam o nascimento de Jesus, todos com a presença do burro e do boi. Recomendo conferir.

Santo Inácio de Loyola, nos Exercícios Espirituais, ao nos guiar na contemplação do nascimento de Jesus, acrescentou detalhes que não estão nos Evangelhos, mas foram retirados de leituras de seu tempo, no século XVI. Nessa descrição, ele incluiu uma jumenta para levar Maria Santíssima e um boi para pagar o tributo (EE 111).

No século XV, Fra Angelico e Fra Filippo Lippi pintaram um pavão no alto da barraca onde está a Sagrada Família, na cena da adoração dos magos.

O que a arte quer transmitir com isso? Talvez afirmar que há espaço para todos na grande cena do Amor Encarnado. O universo é chamado a juntar-se ao tradicional cântico natalino “Oh, vinde adoremos o Salvador!”.

Agora, vamos imaginar a cena:

Às vezes, ao pensar nos animais no presépio, queremos encontrar utilidade em cada um: o burro para transporte, a ovelha pela lã, a vaca pelo leite, e assim por diante. Isso é válido, mas está longe de uma contemplação amorosa da criação como dom e bênção de Deus.

A contemplação não busca apenas a utilidade; ela nos envolve na beleza única de cada ser, abrindo a porta para uma visão mística do amor de Deus. Vamos dedicar um olhar atento a cada animal que vier à mente.

Vamos caminhar com esses bichos. Nesse passeio, relembre o texto de Isaías que diz que o lobo vai conviver com o cordeiro, a pantera vai se deitar ao lado do cabrito; o bezerro e o leãozinho vão pastar juntos, e um menino vai guiá-los; o urso e a vaca vão pastar juntos, e suas crias vão ficar deitadas lado a lado, e o leão vai comer capim como o boi (Is 11,6-7).

Escute os sons de cada animal: relinchos, mugidos, trinados, gorjeios, uivos, coaxares…

Toque sem medo. Passe a mão na pelagem de uma das feras, brinque com os filhotes. Sem receio, como Isaías prometeu, o bebê vai brincar no buraco da cobra venenosa, a criancinha vai enfiar a mão no esconderijo da serpente (Is 11,8).

Retorne ao Paraíso e experimente a unidade com a Criação e com o Criador. Submerja nas águas e observe os peixes, junto aos demais animais. Dialogue com os peixes, inspirado por Santo Antônio.

Liberte sua imaginação e voe com garças, guarás e araras. Converse com os pássaros, à semelhança do seráfico São Francisco.

Deixe a alegria invadir o seu coração. Entoe, à sua maneira, o trecho do cântico dos três jovens com o qual iniciamos nossa oração.

Baleias e peixes, bendigam o Senhor;
louvem e exaltem o Senhor para sempre.

Aves do céu, bendigam o Senhor;
louvem e exaltem o Senhor para sempre.

Animais selvagens e domésticos,
bendigam o Senhor;
louvem e exaltem o Senhor para sempre.

Dn 3,79-81

Agradeça por este momento de oração.


[1] Papa Francisco (2013) Exortação apostólica Evangelii gaudium, sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual.


Rezar com o Presépio

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IGNATIANA é um blog de produção coletiva, iniciado em 2018. Chama-se IGNATIANA (inaciana) porque buscamos na espiritualidade de Inácio de Loyola uma inspiração e um modo cristão de se fazer presente nesse mundo vasto e complicado.

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