Rezar com o Presépio (V)

Osmar Ferreira

Curar e reconstruir

O nosso presépio está ficando pronto aos poucos. Estamos compondo a paisagem e colocando seus diversos personagens e elementos, preparando tudo para a chegada da Sagrada Família.

Hoje, vamos incluir um elemento que, em alguns presépios, está lá por causa de seu significado especial: as ruínas. A Palavra de Deus que guiará nossa meditação é um trecho do Evangelho de São João:

No Templo, Jesus encontrou os vendedores de bois, ovelhas e pombas, e os cambistas sentados. Então fez um chicote de cordas e expulsou todos do Templo junto com as ovelhas e os bois; esparramou as moedas e derrubou as mesas dos cambistas. E disse aos que vendiam pombas: “Tirem isso daqui! Não transformem a casa de meu Pai num mercado.” Seus discípulos se lembraram do que diz a Escritura: “O zelo pela tua casa me consome.” Então os dirigentes dos judeus perguntaram a Jesus: “Que sinal nos mostras para agires assim?” Jesus respondeu: “Destruam esse Templo, e em três dias eu o levantarei.” Os dirigentes dos judeus disseram: “A construção desse Templo demorou quarenta e seis anos, e tu o levantarás em três dias?” Mas o Templo de que Jesus falava era o seu corpo. Quando ele ressuscitou, os discípulos se lembraram do que Jesus tinha dito e acreditaram na Escritura e na palavra de Jesus.

João 2,14-22

Pode parecer estranho adicionar algo um pouco sombrio, como ruínas, na paisagem tranquila do nosso presépio. No entanto, a força está em seu significado: no lugar de antigos palácios e templos, Jesus é o centro e o destino de nossa jornada.

O Templo, que costumava ser o lugar especial de encontro com Deus, perdeu sua essência. Quando Jesus expulsou os comerciantes, condenou a exploração dos pobres pelas autoridades religiosas. Ao prever a ruína do Templo, ele mostrou que essa instituição religiosa havia perdido sua vitalidade. A partir de agora, o verdadeiro Templo é o corpo de Jesus, que morre e ressuscita. Deus não quer habitar em construções, mas no coração humano.

Na carta “O Sinal Admirável do Presépio”[1], o Papa Francisco aborda as ruínas desta forma:

Merecem também uma referência as paisagens que fazem parte do Presépio; muitas vezes aparecem representadas as ruínas de casas e palácios antigos que, nalguns casos, substituem a gruta de Belém tornando-se a habitação da Sagrada Família. Parece que estas ruínas se inspiram na Legenda Áurea, do dominicano Jacopo de Varazze (século XIII), onde se refere a crença pagã segundo a qual o templo da Paz, em Roma, iria desabar quando desse à luz uma Virgem. Aquelas ruínas são sinal visível sobretudo da humanidade decaída, de tudo aquilo que cai em ruína, que se corrompe e definha. Este cenário diz que Jesus é a novidade no meio dum mundo velho, e veio para curar e reconstruir, para reconduzir a nossa vida e o mundo ao seu esplendor originário.

Admirabile signum, 4

Essa ideia ressoa um tanto do que Isaías proclama:

As suas ruínas antigas serão reconstruídas, você levantará paredes em cima dos alicerces de tempos passados. Vão chamá-lo reparador de brechas e restaurador de ruínas, onde se possa morar.

Isaías 58,12

A ideia aqui é comparar nossas frágeis seguranças —depositadas em palácios construídos sobre a areia — com Jesus, nosso alicerce sólido, a rocha na qual lançamos nossos fundamentos. Ele nos convida a contribuir para a construção de uma sociedade fundamentada no direito e na justiça.

Em tupi, existe o termo tapera: aldeia abandonada ou uma moradia desmoronada. Lugares que apontam para antigas lembranças. Lugares que se pode dizer “já foi; não é mais…”. Nossas taperas interiores são os lugares de solidão, destroços e entulhos. Convide Jesus para entrar. Permita que Ele reconstrua, restaure, limpe e areje. Somente Ele é capaz de fazer tudo novo (Ap 21,5).

Há outros lugares em ruínas que precisamos visitar, pedindo a Deus a disposição necessária para ajudarmos na reconstrução. Uma dessas áreas são as regiões afetadas pelas guerras. Jesus, o Príncipe da Paz, nos chama a ser promotores da paz.

A guerra é sempre uma derrota, é uma destruição da fraternidade humana. Irmãos, parai! Parai!

Papa Francisco

Diante do presépio, peçamos pela paz em nossas casas, escolas, locais de trabalho, comunidades… Que, de fato, o Príncipe da Paz esteja verdadeiramente presente.

Olhando para as ruínas, lembramos do chamado que São Francisco de Assis recebeu na igreja de São Damião: “Vai, reconstrói a minha casa que, como vês, está em ruínas.” Às vezes, nos agarramos a formas antigas que não representam mais o verdadeiro rosto da Igreja de Cristo. Outras vezes, nos contentamos com estruturas ultrapassadas que nos prendem a uma nostalgia estéril.

Com Jesus, na Sua Igreja, em comunhão, estamos no caminho certo. Ele que é caminho, verdade e vida. (Jo 14,6). Caminhar com Ele, com sua Igreja, caminhar juntos.

O Senhor nos chama para uma obra constante de renovação, trabalhando para tornar Sua casa cada vez mais acolhedora, com portas completamente abertas a todos.

Agora, vamos imaginar a cena:

Pensemos um pouco sobre quais das nossas ruínas interiores Jesus deseja transformar em algo novo e bonito. Convide Jesus para entrar naquela tapera, que está desabitada e triste, esperando pela Sua visita para transformar tudo.

Vamos usar a leitura de Isaías como guia para nossa meditação.

As suas ruínas antigas serão reconstruídas, você levantará paredes em cima dos alicerces de tempos passados. Vão chamá-lo reparador de brechas e restaurador de ruínas, onde se possa morar.

Is 58,12

Imagine uma ruína. Observe externamente, perceba sua antiga importância. Tire um momento para apreciar a visão como um todo. Pergunte a si mesmo: seria um palácio ou uma mansão? Certamente, pessoas com poder e riqueza frequentaram esses lugares. E agora? Está vazio, envolto em sombras…

Aproxime-se, mas não vá sozinho; convide Jesus, o filho do carpinteiro, para acompanhar você. Examinem os estragos. Lembre-se das palavras de Isaías: “As suas ruínas antigas serão reconstruídas, você levantará paredes em cima dos alicerces de tempos passados.” Tudo teve seu tempo; agora há um chamado para uma nova fase, um tempo novo. Compartilhe com Jesus o que está velho e em ruínas dentro de você, necessitando da força renovadora do Espírito Santo para se reerguer. Mais uma vez, relembre Isaías: “Vão chamá-lo reparador de brechas e restaurador de ruínas, onde se possa morar.”

Peça a Jesus a graça de recomeçar, de renovar, de converter-se. Neste Tempo do Advento, peça a graça de construir algo novo, com a ajuda de Jesus e de sua comunidade.

Agradeça por este momento de oração.


[1] Carta Apostólica Admirabile signum.


[1] Carta encíclica Laudato Si’, Papa Francisco (2015), sobre o cuidado da casa comum.


Rezar com o Presépio

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IGNATIANA é um blog de produção coletiva, iniciado em 2018. Chama-se IGNATIANA (inaciana) porque buscamos na espiritualidade de Inácio de Loyola uma inspiração e um modo cristão de se fazer presente nesse mundo vasto e complicado.

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