A função do leigo no mundo
Ligia de Medeiros *
Nós, leigos e leigas, pertencentes à comunidade inaciana, fomos evangelizados, o que nos torna evangelizadores. O que é evangelizar? É dar testemunho, de maneira simples e direta de Deus, revelado por Jesus Cristo, no Espírito Santo. Qual a nossa vocação? O Concílio Vaticano II diz que é administrar e ordenar as coisas temporais em busca do reino de Deus.
Portanto, a eles [leigos] compete especialmente,
iluminar e ordenar de tal modo as realidades temporais,
a que estão estreitamente ligados,
que elas sejam sempre feitas segundo Cristo e
progridam e glorifiquem o Criador e Redentor.
Para a Igreja, a função do leigo, não é tanto a de pregar o Evangelho, mas ser capaz de mudar a sociedade aonde ele se insere. O Evangelho quer que, com a nossa ação, sejamos capazes de mudar os critérios de julgar, as fontes inspiradoras, as linhas de pensamento, os valores, os modelos de vida. A ação evangelizadora vem para converter, ao mesmo tempo, a consciência pessoal e coletiva dos homens.
Nós aprendemos uns com os outros. Os cristãos leigos que vivem o seguimento de Jesus na família, na sociedade, na comunidade da Igreja, no trabalho, contribuem para a educação dos outros, numa ação de aprendizagem recíproca.
A missão da Igreja de formar leigos missionários conscientes e ativos vai ao encontro da necessidade de uma Igreja em saída, que lida com questões cada vez mais desafiadoras no momento atual.
Ajudemos a carregar os fardos uns dos outros;
assim, viveremos a caridade e
cumpriremos a lei de Cristo.
Sabemos que o joio e o trigo convivem e trazem tumulto às nossas vidas. A parábola dos pescadores que jogam a rede e que recolhe peixes graúdos e bagres, nos diz que a bondade e a maldade convivem no mundo. Com separar uns dos outros? Santo Inácio de Loyola fala da necessidade de ordenar os afetos. Para os que não estão familiarizados com a linguagem inaciana, ordenar os afetos vem a ser o preparo e a disposição da alma para tirar de nós todas as afeições desordenadas que nos afastam de procurar e de encontrar a vontade divina. Fazer a vontade do Pai é o máximo de liberdade que podemos desejar: “Ame e faça o que quiser, pois nada do que você fizer por amor será pecado”, diz Santo Agostinho. Crescer em liberdade e domínio de nós mesmos — é isso que é o amor de Deus nos provoca. Parece paradoxal a ordem de fazer a vontade do Pai para atingirmos a liberdade, mas é que a liberdade está em Deus! Não existe liberdade para pecar. Quem peca não é dono de si, o pecado é que é possui o pecador.
As obras de misericórdia superam a indiferença e alcançam a paz que, de outra maneira, é uma utopia. A expressão “globalização da indiferença”, usada pelo Papa Francisco, capta a falta de sensibilidade e de banalização de tantos problemas, como a ganância, segregação, violência, idolatria ao dinheiro, coisificação da nossa humanidade, que é santificada.
No documento 105 da CNBB, está citado que a alma do mercado entrou na alma humana e criou condições perversas de vida, favorecendo uma lógica egoísta e de disputa nas relações.
O contraponto a essa globalização da indiferença é a percepção, com esperança e gratidão, da presença dos cristãos leigos e leigas, santos e santas entre nós. São fortes na fé, solidários e fraternos, intensos na oração, humildes no perdão, silenciosos na ação. Com alegria e perseverança visitam as casas, os hospitais, os presídios, as periferias e atuam em movimentos eclesiais, sociais e políticos, levando a santificação nas estruturas e realidades do mundo. Formam uma nova família que não nasceu da carne e do sangue, mas da Palavra, da Eucaristia, do testemunho dos apóstolos e pela força do Espírito Santo.
Nesse ano dedicado ao laicato, vamos ser sal da terra e luz do mundo — porém é Cristo Jesus o nosso tempero e a nossa fonte de luz.
Vigília da Transfiguração, agosto 2018.
* Lígia de Medeiros é artista, designer e educadora.
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