Retiro Quaresmal 2025 — Semana Santa

“Meu Deus, Meu Deus, por que me abandonastes?”

Domingo de Ramos e Paixão do Senhor – Dia 13.04

Lc 22, 14-23, 56: “Orai para que não caiais em tentação.”

As leituras deste domingo são todas voltadas para a contemplação dos sofrimentos de Nosso Salvador e contêm lições para nós. Na primeira, o profeta Isaías nos fala do Servo Sofredor, que, confiante nas palavras de Deus, aceita o sofrimento: não relutou, não se esquivou dos que o feriam, nem desviou o rosto dos escarros ou daqueles que lhe arrancavam a barba (cf. vv. 5-6).

A semelhança com o que Jesus sofreu após ter sido condenado é tão grande que se passou a ver no Servo do Senhor uma profecia do que Jesus sofreria por amor a nós (cf. Mt 27,27-31). A segunda leitura nos dá uma lição de humildade. Na comunidade de Filipos, havia irmãos querendo ser mais do que os outros. São Paulo, então, ensina-lhes que Jesus nunca deixou de ser Deus quando se encarnou no seio puríssimo da Virgem Maria; sua divindade apenas ficou oculta em seu corpo, semelhante ao nosso. Sua humildade o levou a aceitar ser morto da maneira mais cruel que havia: crucificado, suplício reservado somente aos piores malfeitores.

A segunda parte do texto comemora a máxima vitória de Cristo: ser ressuscitado por seu Pai Celeste. Esse exemplo de Jesus deve servir-nos de meditação neste início da Semana Santa, pois, às vezes, esquecemo-nos de que somos todos iguais. No Evangelho de São Lucas, é proposta a nós a narrativa dos sofrimentos e da morte de Jesus. Os quatro Evangelistas — São Mateus, São Marcos, São Lucas e São João — narraram os sofrimentos e a morte de Jesus, acentuando pormenores que servissem de lição para os cristãos de cada comunidade à qual estavam se dirigindo.

Assim, o de São Lucas destacou alguns detalhes que serviriam de proveito espiritual para superar uma dificuldade da comunidade: o uso da violência. Os apóstolos, presenciando a prisão de Jesus, acharam que deveriam reagir e perguntaram ao Mestre: Senhor, devemos atacá-los à espada?; e até um deles cortou a orelha de um servo do príncipe dos sacerdotes.

Mas Jesus interveio, dizendo-lhes: Deixai, basta; e, tocando a orelha daquele homem, curou-o (vv. 47-51). Com esse gesto e suas palavras, o Mestre lhes quis ensinar, e a nós, que a violência não se resolve pela violência, mas pelo diálogo.

Graça a pedir:
Senhor, dai-nos a graça de vivermos intensamente esta semana santa e crescer no conhecimento interno do Senhor para mais amá-lo e seguí-lo.”

Segunda-feira – Dia 14.04

Jo 12, 1-11: “Deixai-a; ela guardou este perfume para o dia da minha sepultura.”

Desejosos de bem nos prepararmos para a Ressurreição de Jesus e também para ressuscitarmos com ele para sua graça, meditemos sobre as lições deste Evangelho. Maria de Betânia, irmã de Lázaro, agradece a Jesus por ter dado a ela nova vida, e o faz com generosidade, pois tudo o que dermos para o Senhor nunca será demais.

Entretanto, longe de ficar feliz com o gesto tão tocante da irmã de Lázaro, de ungir os pés de Jesus com bálsamo, Judas Iscariotes a censura, e mente, justificando que o valor gasto com aquele bálsamo poderia ser usado para ajudar os pobres. Parece boa sugestão, mas, na verdade, com aquela hipócrita compaixão, ele queria encobrir os seus roubos da bolsa comum. Da mesma forma, os príncipes dos sacerdotes queriam matar Lázaro (aquele a quem Jesus havia ressuscitado) para encobrir a inveja que sentiam pelo sucesso do Mestre perante a multidão. É hora de refletirmos, para também não cairmos em pecado.

Terça-feira – Dia 15.04

Jo 13, 21-33.36-38: “Em verdade, em verdade vos digo: um de vós me há de trair!”.  

Ainda que Jesus já tivesse falado a seus discípulos sobre seus sofrimentos próximos, eles, imbuídos do que imaginavam seus patrícios sobre o Messias (rei poderoso, com exército, corte etc.), não o entendiam. Compreende-se, então, por que, após o Mestre os ter prevenido que estaria com eles por pouco tempo, São Pedro lhe tenha feito aquela pergunta: Senhor, para onde vais?

Parece que os apóstolos tinham se esquecido da vida após a morte. Talvez tenha acontecido o mesmo conosco. Embora a Quaresma seja tempo de conversão, os nossos afazeres ocupam toda a nossa vida. Importa pedir a Deus que aumente a nossa fé e pensar se estamos cumprindo nossa missão de amar tanto os nossos amigos quanto os nossos inimigos.

Quarta-feira – Dia 16.04

Mt 26, 14-25: “Mestre, serei eu?”. “Sim” — disse Jesus.”

Custa-nos compreender que o amor ao dinheiro tenha levado judas a vender o próprio Mestre (!). Jesus já tinha avisado aos seus seguidores: Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou odiará a um e amará o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Nosso Salvador concluiu: Não podeis servir a Deus e à riqueza […1 São os pagãos que se preocupam com tudo isso (Mt 6,24.32).

Os Doze Apóstolos foram chamados por Jesus; todos o acompanharam, presenciaram seus milagres, ouviram sua Palavra… Entretanto, o amor ao dinheiro ilícito fez Judas se esquecer de tudo isso. É hora de compreendermos o perigo de deixarmo-nos levar pelos sentidos. Estes nunca dizem “basta”! São um abismo que atrai outros abismos. Rezemos: Salvai-me, Senhor, das fauces do leão (cf. Sl 41(42),8 e 21[22],22).

Quinta-feira – Dia 17.04

Jo 13, 1-15: “Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, assim façais também vós”.

Diz-nos o texto sagrado que Jesus, sabendo que retornaria em breve para junto de seu Pai, quis dar aos apóstolos um exemplo de humildade, lavando os pés de cada um deles. Esse gesto era serviço de escravos, mas Jesus não titubeou em realizá-lo, mostrando-lhes o comportamento que deveriam manter uns com os outros no decorrer da missão que ele lhes havia confiado.

Logo após, explicou-lhes: Sabeis o que vos fiz? Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem, porque eu o sou. Logo, se eu, vosso Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar-vos os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, assim façais também vós (vv. 12-17). “Lavar os pés uns dos outros” significa estar atento  para servir aos irmãos.

Sexta-feira – Dia 18.04

Jo 18, 1-19, 42: “Convém que um só homem morra em lugar do povo”.  

Hoje, Sexta-Feira Santa, não há a celebração da Santa Missa. Há, porém, a “Ação litúrgica”, na qual, além de ouvirmos as leituras que nos remetem aos sofrimentos a que submeteram Jesus, antes de ser pregado na Cruz, podemos comungar. Os altares sem toalhas e o ambiente pouco iluminado querem representar externamente a tristeza que devemos sentir na alma.

Esse sentimento é concretizado na Adoração da Santa Cruz pelos fiéis. Por isso, no número 17 do Manual das Indulgências, está escrito que a Igreja concede Indulgência plenária aos que hoje participam piedosamente da veneração da Santa Cruz e beijam devotamente o Santo Lenho. Como em todas as cerimônias litúrgicas, devemos acompanhar esse ato com a mente e o coração contritos e agradecidos a Jesus.

Sábado – Dia 19.04

Lc 24, 1-12: “Por que buscais entre os mortos aquele que está vivo?”  

Embora Jesus tivesse profetizado duas vezes que sofreria por parte dos anciãos, dos príncipes dos sacerdotes e dos escribas, e que seria morto e ressuscitaria no terceiro dia (Mt 16,21; 17,22-23), todos os seus amigos tinham se esquecido disso. Seus apóstolos fecharam-se no cenáculo, com medo de também serem mortos pelas autoridades judaicas. As mulheres voltaram para casa, prepararam o bálsamo e os aromas, observaram o preceito do repouso sabatino e, no primeiro dia da semana, foram até o sepulcro.

Chegando lá, acharam a pedra que o lacrava removida; entraram, mas não encontraram o corpo de Jesus. Dois anjos anunciaram-lhes que Jesus havia ressuscitado, como antes o Mestre lhes tinha dito. Só então se lembraram de suas palavras (cf. 14 vv. 1-8). Para nós também, durante toda a Quaresma, Jesus falou de perdão, de misericórdia… Qual foi a nossa reação? 15 Examinemos a nossa consciência e, se encontrarmos algum pecado, arrependamo-nos dele para, hoje, ressuscitarmos com Jesus para uma vida nova!

Domingo – Dia 20.04 – Ressurreição do Senhor!

Jo 20, 1-19: “Então, entrou também o discípulo que havia chegado primeiro ao sepulcro. Viu e creu.”

A liturgia nos apresenta o belíssimo relato que só se encontra no evangelho de João. Esta dupla aparição do Ressuscitado aos discípulos, primeiro na ausência de Tomé, e depois na sua presença, nos diz algo sobre a comunidade cristã primitiva, mas também traz luz sobre as nossas comunidades hoje.

Aí está constituída a nova comunidade pascal; uma comunidade em torno à presença de Jesus; uma comunidade chamada a viver da experiência do encontro com Aquele que consumou sua vida em favor da vida de todos; suas chagas serão, de agora em diante, a melhor expressão da identidade entre o Crucificado e o Ressuscitado. Uma comunidade animada pelo mesmo Espírito de Jesus; uma comunidade não fechada sobre si mesma, alienada das chagas da humanidade, mas aberta, como Ele, ao amor universal para com todas as pessoas. Uma comunidade de amor, capaz de viver o perdão e ser presença misericordiosa.

Somos já “seres ressuscitados” quando vivemos estes dons do Ressuscitado, comprometidos com o Seu projeto carregado de vida, para aliviar as dores e as feridas da humanidade.

Quando acolhemos a presença do Ressuscitado, nossa vida se destrava e torna-se potencial de inovação criadora, expressão permanente de liberdade, consciência, amor, arte, alegria, compaixão…. É vida em movimento, gesto de ir além de nós mesmos; vida fecunda, potencial humano. Vida com fome e sede de significado, que busca o sentido… Vida que é encontro, interação, comunhão, solidariedade. Vida que é seduzida pelo amor, pela ternura. Vida que desperta o olhar para o vasto mundo e move à missão.

Chama-nos a atenção (sobretudo nos evangelhos de Lucas e de João) que Jesus ressuscitado tenha tanto interesse em mostrar a seus discípulos as chagas de suas mãos, seus pés e de seu lado aberto. Que significa isto, um ressuscitado com chagas? Diante de um martirizado ressuscitado, qualquer um esperaria ver um corpo totalmente renovado, rejuvenescido, limpo, sem feridas e marcas do martírio.

E, no entanto, Jesus ressuscitado toma a iniciativa, deixa-se ver, faz-se presença, provoca um encontro. Os discípulos e discípulas buscam um cadáver, para lhe manifestar respeito e carinho. Jesus ressuscitado, como bom pedagogo, busca aqueles e aquelas que o tinham seguido desde a Galileia e, respeitando a liberdade e os tempos de cada um(a), os ressuscita também, reconstruindo-os em sua identidade ferida.

As chagas de Jesus ressuscitado são algo mais que um modo de dizer “sou eu mesmo”. Elas são expressão de identidade, ou seja, pertencem a seu novo ser de ressuscitado. Dito de outro modo: Jesus, vencedor da morte, não abandona o que é caduco e frágil da existência mortal. A fragilidade da carne foi assumida na glória do Corpo ressuscitado. Por isso, suas chagas são terapêuticas, pois curam as nossas chagas do fracasso, do medo, da tristeza, da solidão, da dor… São feridas que curam feridas.


ImagemLuís Henrique Alves Pinto