Luiz Fernando Krieger Merico

O papa Francisco abre a encíclica Fratelli Tutti com o tema “as sombras de um mundo fechado”. Da mesma forma, no capítulo I da encíclica Laudato Sí, propõe que nos detenhamos sobre o que está acontecendo à nossa casa comum, ou seja, nos debruçarmos sobre os conflitos e sombras do mundo atual.

Penso nas sombras da guerra, como exemplifica o próprio papa. Ou melhor, das inúmeras guerras que temos neste momento. São aproximadamente 30 grandes conflitos armados neste momento: Ucrânia, Somália, Síria, Iêmen… a lista é grande. A indústria de armas está muito feliz. Lucram com a morte, estão felizes. Parecia que o mundo tinha aprendido com tantas guerras e fracassos e, lentamente, ia caminhando para variadas formas de integração. Mas, a cultura da violência se espalha. O nosso país não está isento disso. Grupos armados agem também em nosso território, e a quantidade diária de mortos por armas de fogo indica que vivemos em conflito.

Outra sombra que me vem à mente é a destruição de florestas e da biodiversidade. O desaparecimento de Dom e Bruno recoloca a Amazônia nas discussões internacionais. O Brasil sozinho foi responsável por 40% do desmatamento global em 2021. Com a perda da floresta amazônica, se perde também a transferência de umidade para todo o continente sul-americano, o que compromete a agricultura e o abastecimento urbano. Os chamados “rios voadores”, a umidade que é transferida da floresta para todo o continente, se enfraquece progressivamente. Ao mesmo tempo, a janela de oportunidade de produzir mudanças em todo o sistema de produção e consumo, vai se fechando rapidamente. Nossas emissões de gases vêm da queima de petróleo, desmatamento e criação de gado, principalmente. Se não reduzirmos nossas emissões pela metade até 2030, não conseguiremos manter o aumento de temperatura do planeta abaixo de 1,5 graus. Todo o sistema de vida no planeta se verá afetado, produzindo muito, muito mais sofrimento do que já tem gerado. Faça suas contas. Quantas pessoas já perderam a vida no Brasil por desastres climáticos só em 2022?

Ainda outro grande conflito que enfrenta a humanidade são as notícias falsas, ou fake news como dizemos. Grupos articulados se utilizam amplamente de mentiras para destruir a democracia, as instituições, a cultura, a educação e tudo o mais que puderem. Seu objetivo é a destruição institucional, como forma de acesso ao poder. Geram o ódio e o medo na cabeça das pessoas e usam vastamente as religiões como campo de disseminação.

Tendo como pano de fundo os conflitos e sombras de nosso mundo, mas com a esperança da luz da ressureição à nossa frente, sugiro rezarmos com o papa a oração que ele propõe ao final da Fratelli Tutti. É assim:

Senhor e Pai da humanidade,
que criastes todos os seres humanos com a mesma dignidade,
infundi nos nossos corações um espírito fraterno.

Inspirai-nos o sonho de um novo encontro, de diálogo, de justiça e de paz.

Estimulai-nos a criar sociedades mais sadias e um mundo mais digno, sem fome, sem pobreza, sem violência, sem guerras.

Que o nosso coração se abra a todos os povos e nações da terra, para reconhecer o bem e a beleza que semeastes em cada um deles, para estabelecer laços de unidade, de projetos comuns, de esperanças compartilhadas.

Amém.    

Fratelli tutti, 287

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Luiz Fernando Krieger Merico é graduado em Geologia (UFPR), mestre em Análise Ambiental (UNESP), doutor em Geografia (USP), possui aperfeiçoamento no Schumacher College (Inglaterra) em Economia Ecológica. É autor do livro Mística do século XXI: Guia de Oração com as encíclicas Laudato Si’ e Fratelli Tutti (e-book).

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