Lições das chuvas no Sul

Luiz Fernando Krieger Merico

Mística do século XXI — programa nº48

Reflexões a partir das encíclicas
Laudato si’ e Fratelli tutti

Nem as chuvas no Rio Grande Sul terminaram, nem as águas baixaram, e nem sabemos o número exato de mortos e de vítimas, mesmo assim eu queria compartilhar com vocês algumas lições aprendidas. Assim espero de verdade, que sejam lições e que sejam aprendidas.

  1. A primeira lição a ser incorporada é a da escuta atenta. Nossa sociedade parou de escutar. Os sinais de que já entramos em território desconhecido – que são as mudanças climáticas profundas – já vem sendo dados e são muito claros há muito tempo. Sem escutar os gritos da criação, vamos afundando – literalmente afundando – a sociedade humana e comprometendo o futuro de gerações e gerações. Escutemos os cientistas, os ambientalistas, as pessoas de bom senso. Escutemos o papa Francisco e sua encíclica Laudato Sí. Nosso caminho coletivo está em rumo errado. Estamos surdos e cegos e não queremos nem escutar e nem ver.
  2. A segunda lição é, uma vez escutados os gritos e clamores da criação, tomar atitudes concretas e alterar drasticamente e radicalmente nosso sistema de produção e consumo. Todos somos responsáveis por esta tarefa urgente. O desmatamento desenfreado tem que acabar, o uso exagerado e abusivo de agrotóxicos tem que acabar, o uso indecente e irresponsável de petróleo tem que acabar. O uso insano de plásticos tem que acabar. A desertificação tem que ser revertida. Nossa dieta que ser alterada. Não há outra opção. Abramos os olhos: não há planeta B. Nossa fina capa de sustentação de vida está machucada, ferida e infeccionada. Temos que vencer o medo e o ódio que parte da população dissemina e que destrói presente e futuro e encarar de uma vez por todas a árdua tarefa de viver em paz com as pessoas e com a natureza. Construir solidariedade com a vida. É isso que nos pede a encíclica Fratelli Tutti.  
  3. Terceira lição das catástrofes do sul do Brasil: adaptação. Já fomos longe demais e sofrimentos como estamos vendo vão piorar nas próximas décadas. Muito trabalho nos espera para reverter aos poucos o estrago que nossa falta de responsabilidade fez. No curto e médio prazo a situação climática vai piorar – e piorar muito – porque continuamos a destruir continuamente, a aumentar as emissões continuamente a destruir a biodiversidade, os solos, as florestas. Por isso, para reduzir o sofrimento temos que incorporar o termo “ADAPTAÇÃO” ao nosso vocabulário. Adaptar-se para minimizar as consequências humanas e econômicas. Adaptar-se à nova realidade que já está presente. Adaptação tem que se ser política pública de primeira grandeza e de investimentos para permitir que saiamos – um dia – desta situação.
  4. Quarta lição: enfrentamento. As mudanças climáticas não vão retroceder sozinhas. Depende de nosso envolvimento. Depende de nosso voto, de vereador a senador, por exemplo. O congresso brasileiro quer mais destruição. Quem são estas pessoas? A quem servem? A parte lúcida de sociedade humana tem que se fazer ouvir, tem que se mobilizar, tem que enfrentar o desafio da construção da sustentabilidade.

Em respeito a todos e todas que sofreram, sofrem e vão sofrer no futuro, incorporemos estas lições. Já dizia um antigo poeta: nós somos aqueles por quem estivemos esperando. Não teremos alguém para nos substituir nesta tarefa.


Ouça no Podcast Ignatiana [link]

Encíclicas ecofraternais do Papa Francisco

Laudato si’, sobre o cuidado da casa comum (2015)
Fratelli tutti, sobre a fraternidade e a amizade social (2020)

Luiz Fernando Krieger Merico é graduado em Geologia (UFPR), mestre em Análise Ambiental (UNESP), doutor em Geografia (USP), possui aperfeiçoamento no Schumacher College (Inglaterra) em Economia Ecológica. É autor do livro Mística do século XXI: Guia de Oração com as encíclicas Laudato Si’ e Fratelli Tutti (e-book).

Ecologia Economia Mística do século XXI

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IGNATIANA é um blog de produção coletiva, iniciado em 2018. Chama-se IGNATIANA (inaciana) porque buscamos na espiritualidade de Inácio de Loyola uma inspiração e um modo cristão de se fazer presente nesse mundo vasto e complicado.

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